terça-feira, 31 de maio de 2011

Publicidade x obesidade


Especialistas debatem se a publicidade tem impacto sobre a epidemia de obesidade; o questionamento acontece também nos EUACrédito: Fotolia


Entre projetos de lei, decisões da administração federal e a pressão de entidades, a publicidade acabou por ficar na linha de fogo de um movimento global que visa combater a epidemia de obesidade que atinge crianças e adolescentes do mundo todo. Nesse debate, há quem defenda o banimento completo da propaganda de alimentos e bebidas destinados a esse público.

No Brasil, desde o começo do ano está em vigor uma norma da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a RDC 24/2010, que, entre outras medidas, determina a veiculação de alertas sobre os perigos do consumo excessivo para produtos com uma determinada quantidade de açúcar. Fabricantes, anunciantes, agências e veículos que não cumprirem as exigências, diz a Anvisa, estão sujeitos a sanções que incluem multa de R$ 1,5 milhão. Até o momento são nove as entidades amparadas com liminares contra a norma – uma delas é a Associação Brasileira das Indústrias de Alimentos (Abia). A Anvisa está recorrendo.

Além disso, tramitam no Congresso projetos de lei que colocam a comunicação de alimentos e bebidas em xeque. Neste mês, um desses PLs, o 5.921/2001, foi mais uma vez debatido. Acredita-se que o projeto de lei deverá ter uma definição até o fim do ano.

Nos EUA, quatro agências federais divulgaram recentemente diretrizes para nortear um debate público sobre regras para a indústria de alimentos e bebidas. Elas podem permitir apenas anúncios de alimentos considerados saudáveis e ampliar a restrição de publicidade para jovens até 17 anos.

Para aprofundar o debate, Meio & Mensagem procurou profissionais ou dirigentes dos segmentos envolvidos para saber se há real impacto da publicidade sobre a obesidade e se é possível buscar soluções ao permitir o diálogo entre todos.


Roberta Damasceno Michelim - gerente nacional da SubwayCrédito: Robson Monteiro Evaristo

Anunciante

“Fora do Brasil, já temos um cardápio mais voltado ao público infantil. As ações de divulgação e responsabilidade social com crianças que planejamos para os próximos anos no País preveem inclusive participações em escolas, a fim de incentivar a atividade física. Temos ações para nos prepararmos para a Copa de 2014: não queremos dar brinquedinhos. Não é esse nosso foco, mas, sim, falar da inclusão do esporte na rotina das crianças. Nos EUA, fazemos um trabalho bastante significativo com basquete e futebol americano. Sobre a obesidade infantil, o que ocorre no Brasil é uma tendência de avanço dos alimentos processados. Hoje, uma criança de sete ou oito anos já tem doses extras de açúcar e sucos com conservantes na dieta. O sedentarismo e os maus hábitos alimentares com certeza acabam invadindo nossa rotina. E as crianças já não praticam tanto esporte como nas gerações anteriores. No Subway, nossas campanhas — mais abrangentes, também alcançando o público infantil — fazem com que as crianças acabem ingerindo os vegetais que oferecemos, que são oito no total. A publicidade entra na esteira disso se ela promover redes de restaurantes que oferecem frituras, alimentos processados etc. As crianças acabam ingerindo refeições com mais de 500 calorias.”


Walmir Coutinho - endocrinologista e presidente eleito da Associação Internacional para Estudo da ObesidadeCrédito: Divulgação

Medicina

"A publicidade tem impacto sobre o consumo alimentar. Há estudos que mostram que, contadas as calorias, o que se anuncia, a cada hora, para o público infantil, é o triplo do anunciado para adultos. Mas o ideal para combater a epidemia é chegar a uma solução via consenso, com diálogo. Temos visto, principalmente nos EUA, iniciativas que ajudam a enfrentar o problema. É o caso da Coca-Cola, que fechou acordo para não ter vending machines em escolas. Esse é um caminho viável. Brasil, EUA, Rússia e China são os que têm o maior crescimento da obesidade infantil. Precisamos ter consciência do nível de complexidade que envolve a epidemia. Um grupo de especialistas no Reino Unido fez uma analogia: o grau de dificuldade para enfrentar esse problema é o mesmo do aquecimento global. É preciso envolver governo federal, entidades, empresas e ir até o indivíduo. Não se pode olhar para o tema de modo isolado. A publicidade pode ser aliada. Não pensamos no fim da propaganda para esse público. Crianças respondem ao ambiente. A medicina desistiu de tentar mudar a cabeça delas. Tratamento tem de ser do ambiente. É importante despertamos esse nível de consciência para não gerarmos consumo exagerado. A promoção da atividade física também é essencial. Tudo ajuda.”


Adilson Xavier - presidente e diretor de criação da Giovanni+DraftfcbCrédito: Divulgação

Agência

"Tudo que é legalmente produzido e tem salvo-conduto para ser vendido sem prescrição médica ou coisa que o valha, em princípio, não é prejudicial à saúde. Portanto, tem o direito de ser anunciado. Qual seria a lógica para restringir a comunicação de alimentos e bebidas? Até onde sei, a obesidade é resultante dos excessos e pode ser causada pela ingestão exagerada de feijão, arroz, batata... qualquer alimento. Conclusões fáceis costumam ser perigosas, porque evitam questionamentos profundos. Muito fácil, por exemplo, é achar que a propaganda é a culpada de tudo. Atacar a propaganda pega bem, rende notícia, gera votos. Nós, publicitários, estamos simplesmente exercendo a função de comunicar a existência dos produtos que o governo julga bons o bastante para estar nas prateleiras. Fazer uma campanha que alerte sobre os prejuízos causados pelos exageros alimentares, isso sim, tem lógica. Proibir ou restringir a comunicação é atitude simplista de quem se acha no direito de tutelar a vontade do povo. Propaganda não faz nada, apenas conta o que está sendo feito. Propaganda não obriga ninguém a comprar, apenas coloca as opções diante do consumidor. O mais recomendável é reunir as partes interessadas em torno de uma mesa e discutir o assunto como gente grande."


Edmundo Klotz - presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Alimentos (Abia)Crédito: Arquivo M&M

Indústria

"A indústria de alimentos tem plena ciência da gravidade do tema e sabe que deve exercer esforços para contribuir com a construção de uma dieta alimentar mais saudável na sociedade. O consumo excessivo de nutrientes que podem oferecer riscos à saúde é muito mais reflexo dos hábitos alimentares da população do que da composição dos produtos. A adoção de uma dieta mais equilibrada ocorre por meio da implementação de campanhas educativas. Nesse contexto, a contribuição que o governo vem construindo é positiva. A agenda de compromisso deve ser construída com as entidades relacionadas e a população. A Abia está envolvida em parcerias com o Ministério da Saúde, com o objetivo de aprimorar os aspectos nutricionais dos alimentos industrializados e, assim, contribuir para os hábitos saudáveis à população. Como resultados, a associação apresentou a redução de 230 mil toneladas de gordura trans dos alimentos industrializados. Em abril, assinou novo acordo com o Ministério, o qual prevê a redução do consumo de sal para menos de cinco gramas de sal por pessoa por dia até 2020. Cabe salientar que a educação do consumidor será fundamental para o alcance dessa meta de consumo de sal/dia, considerando os hábitos alimentares da população."



Fonte:meioemensagem.com.br

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